No dia 14 de dezembro, sexta-feira, ocorreu mais um massacre seguido de suicídio nos Estados Unidos. No evento, morreram 20 crianças e o atirador matou também sua mãe.
Sobre o jovem Adam Lanza, de
vinte anos, pouco se especulou. Ou melhor, se especulou muito em apenas uma
direção. Psicólogos e criminologistas – na verdade a voz dada a eles na mídia –
sugerem apenas que Adam tinha sérios problemas mentais e que não conseguiremos
atingir os motivos que o levaram ao seu ato final polêmico, pois a
racionalidade de Adam seria, no mínimo, torta.
Ora, não é preciso ir muito fundo
na sociologia para perceber isso! Quando a sociologia estava no berço, Durkheim
já falava em comportamentos doentios (patológicos) em sociedades, que seriam
aqueles “exceção”, e não “regra”.
Ao arrotarmos alto no ônibus ou
cometermos o ato de Adam Lanza, estamos agindo como doentes sociais, obviamente
em graus muito distintos.
Agora, desejo sugerir uma visão
mais profunda e especulativa sobre Adam, calcando em dois conceitos usados na
sociologia: anomia e ambivalência dos sentimentos (algo retirado da psicanálise,
e aproveitado principalmente pela sociologia clínica).
Adam Lanza foi retratado pelos
colegas como um rapaz extremamente tímido, que não conversava com ninguém e mal
podia olhar nos olhos de outros. No grupo escolar, ele não era percebido pelos
outros: não atraía a atenção e não era coagido a fazê-lo. Ele talvez pudesse
ter uma infinitude de desejos frustrados, vontade de beijar as meninas, de ser
um cara bacana e divertir os outros. Ou achar aquilo tudo – a “vida jovem” –
algo chato e sem apelo, as pessoas sendo marionetes de um estilo de vida sem cor
nem sabor. Uma outra alternativa (e bem possível se tratando de um jovem) é a
ausência de reflexão sobre sua situação: Adam nem pensava em sua identidade,
apenas “chegou lá”.
Adam Lanza cometeu o atentado em
uma fase crucial para jovens: o pós-escola. Nessa fase costuma-se acentuar
reflexões sobre nossa identidade, e o sentimento de “o que faço me define” fica
mais agudo. Adam pode ter começado a pensar mais nesse assunto, e não ter visto
grandes perspectivas: ao invés de seguir com uma vida que não iria lhe conceder
muito (ele podia ter expectativas altas demais, ou nenhuma), preferiu ter um “fim
magistral” e ficar marcado na história, mesmo negativamente.
A anomia aparece aqui de três
formas: na vida silenciosa de Adam, na sua decisão de morrer e na sua decisão
de matar vários, inclusive crianças, antes de seu óbito. A anomia é o sentimento
de não pertencer a sua sociedade, mas que reflete a “inação” desta em puxar os
indivíduos para dentro! Ou seja, a própria forma de funcionar da escola abre
espaço para haver indivíduos como Adam.
Ao querer morrer, Adam não viu
nada bom o suficiente para se desejar a permanência na Terra: se desconectou
das coisas que geralmente são valorizadas e impulsionam o apreço à vida. Nesse
caso, o mais visível sintoma é o assassinato de sua própria mãe e de crianças
(seres inocentes). A anomia nesse caso foi intensa? Se normalmente seu sintoma é
o suicídio, a que corresponde o massacre?
(continua)