quarta-feira, 23 de abril de 2014

O "Ei, você é burro" de Pondé

A última cartada de Luis Felipe Pondé foi o texto "Por uma direita festiva" que gerou infinitas controvérsias.
Farei uma análise otimista, pressupondo que Pondé não é burro e que possui conteúdo filosófico significativo.

Primeira coisa: o texto não é sobre "pegar mulher". O fato de ter causado tanta discussão, mostra que isso ainda é algo relevante em nossa sociedade. Quantos não ficaram ofendidos com a objetificação das mulheres da superfície do texto? O peso negativo da abordagem mostra que temos um problema grave de gênero. Ponto para o Pondé, que pôs o dedo na ferida.

Segunda coisa: o texto é destinado ao público de esquerda que detesta Pondé e fica reclamando dele. Para ficarem ofendidos, e ficarem contentes com a burrice da direita. Mas Pondé não é dessa corrente. Não de verdade. Ele gosta de ser do contra, só isso. Tem preguiça de idealismo juvenil, que acha que o mundo pode ser bom. Por isso "virou à direita" - porém falar assim é tolice, ele é apenas um melancólico.

Mas o jovem de esquerda padrão lerá e ficará ofendido. Pondé atinge seu objetivo: denunciar uma condição humana de forma pessimista, que é sua verdadeira "vibe". Claro que a vítima não percebe isso, e o filósofo se premia a exclamação "Ei, você é burro!". Quer entender mais? Preste atenção ao final do texto: viremos uma Venezuela, e os liberais vão pegar todas. O acaso histórico transforma em heróis a esquerda aqui, e a direita lá (dentro do círculo moderninho-politizado-jovem).

Sexualidade nunca foi muito importante para Pondé: as pessoas que se comam da maneira que quiser. E que preguiça da controvérsia que gira esse assunto!

Já a forma com que certas pessoas abraçam um conjunto de ideias, se vendo como partidários de um projeto rotulado como esquerda, isso o diverte. Ama comentar com acidez e tentar destruir esses muros ideológicos com razão cínica.

Se você acha Pondé uma besta, ele tentou mandar um recado com esse texto: "Se ofenda, e prove sua burrice!". Sua animosidade lhe incomoda. Qualquer colorido lhe arde os olhos. Se daqui a dez anos o idealismo da moda for um liberalismo vendido como salgados em universidades, preparem-se para o texto "Por uma esquerda festiva 2.0".

terça-feira, 8 de abril de 2014

Porque crítica ideológica é uma questão de gosto

Em um texto anterior, escrevi sobre uma controvérsia que envolve entretenimento e política. Hoje volto a ela, para tratar de um assunto velho e ultrapassado, mas que é interessante de medir seus pontos.
Uma das "armas" mais interessantes dos marxistas é a chamada ideologia, ou a crença em uma configuração mental que faz as pessoas aceitarem seus modos de vida.
Não há nada de errado com essa ideia, afinal, as pessoas crescem em determinados contextos e aprendem a pensar de acordo com o que lhes chega.

Mas a partir daí, quase nada pode ser dito sem ser subjetivo. Qual a ideologia de um discurso x? E a de Fulano? As respostas são uma rede de ideias, que podem estar aliadas com coisas aparentemente opostas. O nazismo tinha nacional-socialismo no nome oficial, e se opunha ao comunismo (também chamado de socialismo real). Um partido comunista governa um dos maiores países capitalistas da Terra. Quem é o dono das ideias, para estabelecer como elas podem se relacionar, e definir com coerência e clareza as diversas doutrinas existentes no planeta?

Não há. Ninguém pode fazer isso. Qualquer um pode inventar uma ideologia. Elas são efêmeras, podem aparecer e sumir num piscar de olhos. Ao que elas se referem, é independente de uma reflexão racional sobre elas. Ninguém falava em ideologia na Idade Média, mas o feudalismo existia. E chamavam seu sistema político de "ordenação divina", e quem somos nós para contrariá-los?

Há um cosmos de ideologias, muitas vezes em um conflito para ver quem fala mais alto. Elas são medidas dentro de uma outra ideologia, ou reflexivamente, por autoanálise. Não há como avaliar qual a melhor sem recorrer a uma ideologia, que também pode ser questionada e por aí vai.

E se não há melhor, torna-se uma questão de preferência: José critica o feudalismo, pois prefere o capitalismo. Adorno critica o capitalismo, pois prefere o utopismo. José e Adorno, um brasileiro e outro alemão, são da mesma ideologia. Uma que analisa as outras. Cada um tem seus seguidores, com práticas distintas. As pessoas têm formas particulares de passar o tempo.

Lembrando que isso é uma redução grosseira do conteúdo das ideologias. Mas realmente aqui o conteúdo não importa. Estou olhando para as "armas": argumentos tentando se erguer como razoáveis. Os choques culturais são cada vez mais raros, mas ainda existem, e estão aí como prova. Não há como dialogar com uma cultura realmente alternativa.