segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Televisão x videogame

David Foster Wallace, aclamado escritor de quem sempre falo por aqui, costumava tecer uma crítica ao entretenimento televisivo em torno da sua superficialidade.
Segundo ele, o objetivo da TV é basicamente manter as pessoas assistindo-lhe o máximo de tempo possível. Para isso, o conteúdo deve ser cômodo, confortável, dispensando esforço por parte do espectador, que se torna um consumidor passivo. Sua literatura em larga escala foi uma tentativa de exigir do leitor certo esforço para aproveitá-la; DFW pensava que a vida não devia ser apenas uma busca por prazeres simples de alcance barato--certa dor e dificuldade eram inerentes à condição humana e eram passos inerentes à maturidade. Ele e alguns amigos viam um tipo de tristeza na América moderna, devido a tal submissão cega ao prazer imediato e plano.

Compartilho dessa ideia: um certo grau de masoquismo é importante para a construção do caráter.
A notícia abaixo, por exemplo.

Brasileiros têm de entender que estudar não é chato; chato é ser burro

 Ela tem a premissa de que chato=ruim.
Por que temos de fugir sempre do que é chato? Homo ludicus, aquele que procura sempre a diversão, tornou-se um paradigma de caráter. Isso precisa ser urgentemente desconstruído. O chato faz parte da vida e acolhê-lo melhora as pessoas, torna-as menos egoístas, mais instruídas (não deveria fazer diferença que estudar seja chato ou não--é um critério de medida estúpido), enfim: viver em sociedade devia ter ao menos um pouco de autonegação, super-ego sobre ego, e isso parece estar sumindo.
Indivíduos estão querendo ser deuses, no entanto, os que mais chegam próximos do Olimpo são aqueles cientes de que não conseguirão escalá-lo.

***
DFW falou muito sobre TV, mas nada sobre videogames.
Jogo videogames há muito tempo, e certamente ele requer trabalho do usuário, ao contrário de sua prima mais velha. Alguns jogos mais do que outros. Mas me lembro de que, antigamente, nos anos 90, os jogos eram muito mais difíceis do que hoje. Não sei como continuei jogando, era frustração atrás de frustração. Aí há uma lição de vida muito importante, a repetição aliada à paciência e ausência de insatisfação é uma grande virtude, que ajuda a desenvolver habilidades como concentração e tranquilidade

DFW fala da importância da TV para moldar a literatura de sua geração. Em seu caso, isso significa aliar uma pauta de diversão a uma pauta de comunicação de ideias complexas. Ele faz isso muito bem, e talvez mais importante, isso comunica-se com a geração atual.

Isso me levou a pensar na influência do videogame. Há alguma influência de estilo, de estrutura, de projeto?
Particularmente, acho que NES, SNES, PS1, PC games, N64 (na casa de amigos--eu tinha um Playstation) não me influenciaram em termos de projeto literário. A mecânica (RPG, plataforma, esporte, FPS, beat'em up etc.) e o gênero (ficção científica, fantasia, terror) certamente me moldaram e continuam orientando meus gostos. Mas num nível mais geracional/abstrato, enquanto membro de uma geração gamer, penso apenas que o videogame ajudou-se a gostar de livros difíceis. De certa forma estamos jogando um jogo ao tentar interpretar complexidades literárias. Jogos difíceis, que exigem "detonado" em certas partes, são análogos àqueles livros demandando consultas ao dicionário ou literatura secundária.
Claro que ler com a Internet ao lado também ajuda, mas é outra história.

sábado, 17 de outubro de 2015

Coletivismo e transcendentalismo

Cá estava eu pensando na diferença entre individualistas e coletivistas.

Após um tempo de reflexão, cheguei à ideia de que uma diferença crucial é de linguagem: individualistas observam que coletivistas não se veem como agentes fazendo o que eles pensam que é o certo, mas que pode não ser o certo para os outros. Coletivistas (C) acreditam num ordenamento social justo e transcendental, algo objetivo externo às opiniões.

É estranho pensar num C que não pensa assim: se ele acha que seu desejo de sociedade é uma formulação particular, não deixa de ser C? Não passa a ser um I querendo impor seu desejo aos outros indivíduos? Um I autoritário?

Difícil imaginar que ser C não exija senão ingenuidade, ao menos cinismo.

Claro que por trás desse pensamento há a convicção de que não podemos hierarquizar coisas subjetivas; o utilitarismo, por exemplo, afirma que as melhores decisões são as que deixam mais pessoas felizes. E quem possui a régua dos sentimentos? Quem os mede? Mesuras necessariamente autoritárias, não?

Ainda estou a encontrar uma filosofia C que esteja calcada na lógica e racionalidade (ainda preciso ler Carnap -- que pelo que ouvi falar foi positivista lógico e socialista). Pois pelo que vi até hoje, tais princípios apontam que todo exercício de poder -- imposição de opinião, no caso -- é autoritário. O individualismo parece ser uma solução mais lógica, aí: é a busca pelo ambiente onde cada desejo individual se entrelaça sem coações de outros indivíduos, sem alguns ditando nem meios nem fins. Voluntarismo.

E claro que penso que liberdade é o máximo de justiça possível, dada a constelação de misticismos que povoa cada corpo deste mundo.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Graça Infinita -- Hal Incandenza

"Como a maioria dos norte-americanos de sua geração, Hal tende a saber bem menos sobre por que ele se sente de certas maneiras quanto aos objetos e buscas a que ele está devotado, do que quanto ao objetos e buscas em si. É difícil dizer com certeza se é mesmo algo excepcionalmente ruim, tal tendência."
(minha tradução--ficou confusa? em inglês parece bem claro, e ao traduzir achei que embolou)