segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Weber é niilista?

Quando nos deparamos com os textos sociológicos de Weber, nos damos conta de uma profunda distinção que se cristalizou nos estudos sociais posteriores, e não apenas em sociologia, mas também em economia e ciência política. Os seres humanos e suas ações podem estar em dois planos. De um lado, temos o plano da lógica, da formalidade e dos grilhões do mundo físico. Aí se inserem os fatos e a racionalidade. Dentro dessa dimensão, os debates seguem os ditames da lógica e ciência (quer queiramos ou não).

Mas as coisas não são apenas questão de arranjar as peças de acordo com as regras que as acompanham. Afinal, a pergunta "quais são as regras?" nunca é gratuita. Fazemos um esforço criativo e existencial para dar origem a tais regras. E a primeira dimensão, da lógica, é subordinada a esta, a seletiva. Ela seleciona aquilo que é o caso, um ato do livre arbítrio por assim dizer, e só depois aparece o quadro a ser arranjado com as diversas peças criadas pelo ato seletivo.

O ato de seleção não é gratuito. Isso quer dizer que: 1) ou ele é sociocultural, e as determinações contextuais dos indivíduo o constrangem a fazer certas seleções (e é por isso que podemos falar que "todo conhecimento é político", já que forças nos impelem a tomar certas seleções ao invés de outras), e nesse caso a abstração da parte do todo é menor; 2) ou ele é existencial, e o pensador enxerga que as seleções são um "salto de fé", em si totalmente não fundável, mas que é parte constitutiva da vida humana.

Provavelmente a maior parte da humanidade se encaixa em 1. Isso quer dizer, muitíssimo grosso modo, que "as sociedades pensam por elas". São indivíduos receptáculos da cultura, que vivem com ela em consonância, e que aparentam fomentar sua continuidade no longo prazo.

Em 2, vemos o que se pode chamar de "mente moderna". Muitos pensam que isso sugere que ela é a mentalidade que substituiu a 1, na passagem da "Antiguidade à Modernidade". Mas seu poder não é tão amplo assim (infelizmente, creio eu), e talvez sua presença seja mais forte que a 1 apenas nos Estados Unidos e Europa Ocidental. O que ela tem de especial é sua capacidade de distinção, entre fatos e valores, e entre as próprias mentalidades distintas que estou mostrando aqui. Esse texto é um retrato da modernidade de que ele está tratando haha!

O niilismo, em Nietzsche (do qual Weber era fã), é tratado na citação de Vontade de Potência: 
- O que significa niilismo? – que os valores mais altos se desvalorizam. Falta a finalidade; falta a resposta ao “por quê?”

Weber, entendendo o caso, utilizou "valores" como ferramenta de análise sociológica, e mostrou que o mundo está povoado por uma infinidade de valores em constante atrito, o que caracteriza o grande leque de diferenças individuais e sociais. Valores não têm justificativa. São o que são, e no mundo moderno, são indiscutíveis, uma vez que não há critério científico (nem moderno), para hierarquizá-los. Face a eles, podemos apenas constatar que há um politeísmo de valores no mundo, uma "luta de opiniões".

Esse é o grande Weber, querido dos cientistas sociais razoáveis. Tomo partido dele, apesar de achar que não há partido algum, apenas lógica nesse caso. E é niilista? Em todo esse sentido, é sim, assim como a ciência. Não há ato seletivo de valores científico, nem cálculo de "melhor valor" ou algo do gênero. É um salto de fé, ou uma imposição sociocultural. Reconhecer isto é sim, em certa medida, ser niilista. E então, nós, raça moderna de razoáveis, ao pararmos para "pensar bem", constatamos o vazio das possibilidades, o existencialismo que sugere que temos uma montanha de escolhas e que viver é um processo seletivo, que corta vidas possíveis que vão sendo deixadas para trás. Mas, ao lado desse vácuo do livre arbítrio, temos o tudo das culturas e sociedades do mundo, da imensidão do céu que nos sugere que há mais valores entre ele e a terra do que sonhamos em qualquer ocasião. É o que movimenta a ciência. Em sociologia, a névoa perene dos valores, e de como se age em torno deles, movimenta as engrenagens que tornam essa disciplina uma construção de conhecimento.

(e viva o niilismo, que permitiu tudo isso!)

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